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Endometriose

Por Dr. Murilo Oliveira

Recebeu o diagnóstico de endometriose ou desconfia que tem a doença? É compreensível que você sinta medo, insegurança e ansiedade ao pensar que essa condição pode impedir suas chances de engravidar um dia, mas não deve perder as esperanças, porque temos possibilidades.

A endometriose é uma doença benigna, crônica e inflamatória que afeta aproximadamente 10% das mulheres em idade reprodutiva. Estima-se que até 50% dessas portadoras vão enfrentar dificuldades para engravidar.

Mulheres no auge de sua idade reprodutiva — entre os 20 e 35 anos — são acometidas pela endometriose e podem levar anos para ter o diagnóstico confirmado. Com isso, podem perder um tempo precioso, aumentando as chances de infertilidade.

O que caracteriza a endometriose é a presença e o crescimento de tecido endometrial fora da cavidade uterina, o qual deveria existir somente na parte interna do útero. Entre os órgãos comumente afetados, estão: tubas uterinas, ovários, intestino, outros locais da região pélvica e qualquer outro órgão do organismo.

Trata-se de uma doença que impacta a qualidade de vida da mulher, portanto precisa de muita atenção. Com apoio especializado, diagnóstico preciso e tratamento personalizado, muitas mulheres superam os desafios da endometriose e da infertilidade.

Causas de endometriose

A doença é considerada multifatorial. Estão envolvidos fatores hormonais, genéticos, imunológicos e até ambientais. Contudo, o principal mecanismo é a inflamação localizada na região pélvica, em resposta à ação de hormônios, especificamente o estrogênio.

A função do estrogênio no ciclo menstrual é estimular o crescimento das células endometriais para deixar o endométrio com maior espessura e adequado para a implantação de um embrião, caso o óvulo seja fertilizado. Quando isso não acontece, o tecido endometrial descama e provoca a menstruação.

Nos locais com implantes de endométrio ectópico (fora do útero), também ocorre resposta ao estrogênio, crescimento das células e sangramento. Isso leva à reação inflamatória no local lesionado.

Embora o estímulo estrogênico seja um mecanismo determinante, as causas da endometriose não são completamente conhecidas. A teoria mais aceita para compreender a origem da doença é a teoria da implantação de Sampson ou da menstruação retrógrada.

De acordo com essa teoria, parte do fluxo menstrual, que deveria escoar pelo canal vaginal, reflui pelas tubas uterinas, dispersando fragmentos de endométrio na cavidade pélvica. Esses fragmentos se implantam em órgãos próximos e se mantêm funcionais, respondendo à ação cíclica do estrogênio.

Principais sintomas de endometriose

Os sintomas de endometriose podem variar de apresentação e intensidade conforme o local lesionado e a profundidade dos implantes. De acordo com as características morfológicas, a doença é classificada como:

  • peritoneal/superficial — os implantes se localizam na superfície do peritônio (membrana que recobre os órgãos da pelve e do abdome);
  • endometrioma/cisto endometriótico ovariano — cisto preenchido por sangue envelhecido, resultante do tecido endometriótico que se implanta no ovário;
  • endometriose profunda — forma geralmente mais agressiva da doença, que ocorre quando os implantes penetram no peritônio e se infiltram nos órgãos pélvicos, podendo distorcer sua anatomia e causar a formação de aderências.

De modo geral, os principais sintomas de endometriose incluem:

  • cólicas intensas;
  • dor pélvica;
  • dor na relação sexual;
  • problemas intestinais e urinários no período menstrual, se o intestino e a bexiga forem lesionados.

A dificuldade para engravidar é outro sinal de endometriose. A doença pode afetar a fertilidade de várias formas. Veja os possíveis impactos na saúde reprodutiva da mulher:

  • redução da reserva ovariana e da qualidade dos óvulos;
  • ambiente pélvico inflamatório e desfavorável para o desempenho dos espermatozoides e a interação com o óvulo no processo de fertilização;
  • alteração anatômica de órgãos reprodutores, como a distorção ou obstrução das tubas uterinas, devido à presença de aderências;
  • comprometimento da receptividade endometrial.

Investigação diagnóstica da endometriose

Identificar a endometriose precocemente pode abrir mais portas para o tratamento certo, o que é importante para a melhora da qualidade de vida e a restauração da fertilidade enquanto a paciente ainda é jovem — lembrando que o avanço da idade feminina é um dos fatores de infertilidade.

Entretanto, há muito atraso no diagnóstico. Algumas mulheres demoram vários anos para confirmar que têm endometriose. Isso pode acontecer por dois motivos: desconhecimento da doença, por exemplo pensar que sentir cólicas é normal; investigação incompleta, feita por profissionais com pouca experiência ou com recursos diagnósticos de baixa acurácia.

O diagnóstico da endometriose geralmente é clínico, baseado no relato dos sintomas e no exame físico. Também são necessários alguns exames para complementar a investigação e avaliar o grau de extensão da doença.

As técnicas diagnósticas mais indicadas são a ultrassonografia e a ressonância magnética, ambas com protocolo especializado que envolve o preparo intestinal para facilitar a visualização das lesões durante o exame. 

O profissional também deve ter atenção ao diagnóstico diferencial, pois nem toda cólica abdominopélvica intensa é indício de endometriose. É preciso afastar outras causas, ginecológicas ou não, como: mioma uterino, intolerância a lactose ou glúten, entre outras. Dependendo da condição, é possível melhorar os sintomas apenas com mudanças dietéticas ou medicações.

Formas de tratamento para endometriose

A endometriose não tem cura, mas tem controle. Por isso, é fundamental manter o acompanhamento com um médico especializado. O tratamento pode ser multidisciplinar. Além do ginecologista, a mulher pode precisar de orientação nutricional, psicológica e de terapias complementares, como a acupuntura.

A conduta terapêutica depende de vários fatores: intenção de gravidez; idade da paciente; estado da reserva ovariana; sintomatologia; comprometimento dos órgãos; etc. São várias possibilidades.

O tratamento pode ser apenas clínico, feito com bloqueio do eixo hormonal para inibir a ação do estrogênio. Analgésicos e anti-inflamatórios também são indicados para controle de dor. Assim, é possível fazer um controle dos sintomas e da inflamação e prevenir o agravamento das lesões. No entanto, essa opção é para mulheres que não querem engravidar.

Em alguns casos, a cirurgia é indicada, por exemplo: se houver sintomas intensos ou se as lesões estiverem prejudicando o funcionamento dos órgãos (ovários, intestino, vias urinárias ou outros). O procedimento cirúrgico é feito preferencialmente por videolaparoscopia ou cirurgia robótica, técnicas minimamente invasiva que possibilitam a remoção do tecido endometriótico, melhorando a sintomatologia da doença e aumentando transitoriamente, em alguns casos, as chances de gravidez espontânea.

Se tiver infertilidade, a portadora de endometriose também pode procurar um especialista em reprodução humana. Entre os tratamentos disponíveis, a fertilização in vitro (FIV) é uma importante alternativa, pois permite que os óvulos sejam fecundados em ambiente controlado e que o embrião chegue ao útero sem passar pelas barreiras que a doença causa, como a obstrução das tubas uterinas.

Uma dúvida comum entre as pacientes que têm endometriose é se a doença afeta as chances de sucesso do tratamento com FIV. Pode afetar, sim, dependendo do grau de acometimento e dos locais lesionados.

Nesse sentido, a endometriose pode reduzir a reserva ovariana/qualidade dos óvulos, se afetar os ovários, ou prejudicar a coleta de óvulos, resultando em menos óvulos maduros captados e menores chances de formar bons embriões. Além disso, essa doença está associada à diminuição da receptividade endometrial, o que leva ao risco de falha de implantação do embrião no útero.

Outra dúvida das pacientes com endometriose se refere ao preparo específico para a etapa de transferência embrionária. Isso depende de cada situação. Por exemplo, se houver um ambiente pélvico muito inflamado, pode ser preciso realizar o preparo do organismo da mulher por 2 ou 3 meses para desinflamar a região pélvica e, depois desse período, transferir o embrião para um ambiente mais favorável. Nessas situações, devemos valorizar o acompanhamento multidisciplinar para potencializar a fertilidade.

O tratamento também inclui melhora do estilo de vida, como mudanças nos hábitos dietéticos associadas a uma suplementação vitamínica, prática regular de atividades físicas, entre outras. 

Como a endometriose tem apresentações variadas, é necessário individualizar o tratamento para ter estratégias que aumentem as chances de gravidez. É importante ter uma condução adequada nesse momento, que é tão singular e delicado, contando com a experiência e a visão humana de um profissional que sabe como lidar com a doença e com a infertilidade.