A infertilidade feminina é um tema amplo e delicado, que representa um desafio na vida de muitas mulheres e casais. Apesar das dúvidas e inseguranças a respeito dessa condição, é importante que você saiba que os fatores diagnosticados são superáveis, na maioria das vezes.
Para começar, precisamos lembrar, resumidamente, como o sistema reprodutor feminino funciona. Todos os órgãos do aparelho genital da mulher participam de alguma forma do processo natural para engravidar. Os ovários, as tubas uterinas e o útero têm funções diretamente relacionadas aos processos de ovulação, fecundação, implantação do embrião e gestação.
Quando uma gravidez acontece espontaneamente, ocorrem as seguintes etapas:
Os ovários, as tubas uterinas e o útero devem estar saudáveis e cumprindo suas funções plenamente para que todo esse processo de concepção se complete. No entanto, diversas doenças oferecem risco à fertilidade feminina quando alteram a anatomia e/ou a capacidade funcional desses órgãos.
A dificuldade de engravidar pode envolver muitos fatores, desde hábitos e comportamentos até doenças nos órgãos reprodutores.
Esses fatores, geralmente, podem ser tratados, o que devolve a capacidade reprodutiva à mulher, mesmo que seja necessária alguma técnica de reprodução assistida. Já a idade leva à infertilidade de forma irreversível, por isso o congelamento de óvulos para a preservação da fertilidade é tão importante hoje, já que muitos casais estão postergando a maternidade.
Vamos listar aqui as causas mais comuns de infertilidade feminina.
As mulheres assumiram mais papéis sociais ao longo do último século. Hoje, vemos uma tendência a postergar a maternidade para depois dos 30 ou até dos 40 anos. O que muitas pessoas não compreendem é que esse adiamento pode reduzir significativamente as chances de gravidez.
O principal fator de infertilidade feminina relacionado à idade é a queda da qualidade dos óvulos. Com o passar dos anos, essas células envelhecem, assim como todo o organismo.
A redução da qualidade dos óvulos pode levar à formação de embriões frágeis e com alterações cromossômicas. Nessa condição, o embrião tem menor potencial para se implantar no útero e se desenvolver de forma saudável.
A idade de 35 anos é um número de referência quando falamos em redução da fertilidade feminina, mas, na verdade, esse declínio se inicia a partir dos 32 anos. A princípio, é uma queda suave, quase imperceptível. A partir dos 35, se torna acentuada e depois dos 40 as chances de gravidez são muito baixas.
Entretanto, é importante saber que as estatísticas representam uma média e que cada pessoa é única, ou seja, os efeitos da idade variam de uma mulher para outra. Também há condições que levam à infertilidade precocemente, como a menopausa precoce. Por isso, é importante procurar avaliação médica sempre que notar alguma alteração na saúde.
As disfunções ovulatórias são causas frequentes de infertilidade feminina. A mulher que ovula regularmente libera um óvulo por ciclo menstrual e tem ciclos regulares. As chances de engravidar giram em torno de 15% a 25% por mês de tentativa no ápice da fertilidade (por volta de 20-25 anos). Nas mulheres que têm seus ciclos anovulatórios, que é a ausência de ovulação, esses índices são próximos de zero.
A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é a principal causadora de anovulação crônica. Outras doenças endócrinas também podem afetar a função ovulatória, como o hipotireoidismo ou hiperprolactinemia.
Além disso, alguns fatores relacionados ao estilo de vida contribuem para a desregulação do eixo hipotálamo-hipófise-ovários (HHO), responsável pela secreção dos hormônios que coordenam o ciclo reprodutivo, por exemplo: extremos de peso (obesidade ou magreza excessiva); estresse constante; prática exagerada de exercícios físicos; uso de determinadas medicações, algumas substâncias químicas ou, inclusive, esteroides anabolizantes.
A anovulação pode ainda estar associada à falência ovariana prematura ou menopausa precoce. Entre as causas dessa condição, estão: distúrbios metabólicos; cirurgia nos ovários; radioterapia e quimioterapia; síndromes genéticas.
O útero recebe o embrião, protege e sustenta o feto em crescimento e é capaz de se expandir até o momento do parto. Para cumprir suas funções, esse órgão precisa estar saudável. Entretanto, diversas doenças afetam a anatomia uterina e a receptividade endometrial (condição fisiológica necessária para a implantação embrionária).
Entre as alterações estruturais e funcionais do útero, estão:
Anormalidades no útero podem dificultar a implantação do embrião ou interferir no desenvolvimento gestacional e levar a abortamento espontâneo.
As tubas uterinas precisam estar permeáveis (abertas) para permitir a movimentação e encontro dos espermatozoides e do óvulo. Algumas condições causam obstrução tubária, dificultando o encontro dos gametas, a fertilização e o transporte do embrião para o útero.
Entre as causas de bloqueio ou distorção das tubas uterinas, estão a doença inflamatória pélvica (DIP), endometriose e a hidrossalpinge. Nessa última condição, ocorre um acúmulo de líquido dentro das tubas, sendo uma sequela da salpingite (inflamação tubária).
Quando há inflamações simultâneas nos órgãos da pelve — salpingite, endometrite (na camada interna do útero), cervicite (no colo uterino) e ooforite (nos ovários) —, trata-se de doença inflamatória pélvica (DIP), muitas vezes causada por infecções sexualmente transmissíveis (ISTs).
Além da questão da permeabilidade tubária, ela possui cílios e faz movimentos contráteis que auxiliam no processo de migração de espermatozoides para encontrar o óvulo, bem como o retorno do embrião para implantar no útero. Alguns fatores que podem influenciar negativamente nessas funcionalidades são o tabagismo e a endometriose.
A endometriose é uma doença complexa, que pode acometer vários órgãos da região pélvica, incluindo ovários e tubas uterinas. Essa patologia pode interferir na fertilidade feminina por vários mecanismos:
Além de alguns hábitos já mencionados, que podem levar a desequilíbrios hormonais e anovulação, podemos abordar mais um fator comportamental que influencia as chances de gravidez: o cálculo do período fértil.
O período mais fértil do mês abrange de 1 a 3 dias antes da ovulação, mas existe uma janela de fertilidade que dura aproximadamente 1 semana. O casal tentante precisa aprender a fazer o cálculo, com base nos dias da menstruação e alterações fisiológicas (como o aspecto do muco cervical), e programar suas relações sexuais para os dias de maior fertilidade para extrair o máximo do seu potencial reprodutivo.
A investigação é um passo importantíssimo, pois é por meio dela que podemos identificar se existem fatores de infertilidade feminina — e/ou masculina. Quando diagnosticamos as causas, fica mais fácil definir a otimização e o tratamento ideal para maximizar suas chances de gravidez.
Quando o casal procura precocemente a avaliação de um especialista, pequenas intervenções podem potencializar as chances de gravidez. Algumas pessoas postergam por anos e anos, mas esse adiamento é uma conduta arriscada, pois, como vimos, o passar do tempo e o avançar da idade é um fator adverso significativo à fertilidade feminina. Então, quanto antes o casal for avaliado, maiores serão as chances de gravidez, seja espontânea, seja com auxílio da reprodução humana.
Existem as orientações convencionais para a investigação da infertilidade conjugal:
Nossa recomendação é que o acompanhamento com especialista seja desde o início do processo de tentativas, pois a promoção da saúde pode fazer total diferença na saúde do binômio mamãe-bebê. Contudo, uma possibilidade também é que o casal busque acompanhamento após 6 meses, mesmo antes dos 35 anos. O objetivo é encontrar precocemente o fator que dificulta a concepção e aumentar as chances de gravidez espontânea. Se necessário, vamos para o tratamento com técnicas específicas.
Na consulta inicial, temos uma conversa estruturada, com o objetivo de conhecer as características individuais de cada casal, por exemplo: sintomas que levam à suspeita de infertilidade; estado da reserva ovariana; padrão menstrual; histórico reprodutivo; condições gerais de saúde, hábitos etc. As questões masculinas também devem ser investigadas desde a anamnese.
Todas as informações coletadas são importantes para saber quais são as chances de gravidez agora ou daqui a 5 anos, por exemplo, e quais estratégias podemos utilizar para contornar o impacto negativo do avançar da idade no teu planejamento familiar, principalmente se você pensa em ter mais de um filho.
Os exames solicitados durante a investigação diagnóstica da infertilidade conjugal incluem: dosagens hormonais, ultrassonografia transvaginal, histerossalpingografia, espermograma para o homem, entre outros que são guiados pela avaliação médica (anamnese e exame físico).
Um ponto interessante é que temos o recurso do ultrassom no consultório e uma dúvida comum entre as pacientes que vêm à primeira consulta é sobre a reserva ovariana. Com a ultrassonografia ao alcance e a experiência na avaliação da fertilidade feminina, conseguimos apresentar esse parâmetro já na avaliação inicial. Assim, antecipamos alguns passos da investigação e podemos iniciar a jornada reduzindo a ansiedade do casal.
O tratamento é personalizado, definido com base na avaliação completa do casal, não apenas da mulher. Para ter um embrião saudável, precisamos de um bom óvulo e um bom espermatozoide. Se um deles não tiver a qualidade adequada, o embrião não será saudável, e isso pode comprometer as chances de gravidez. Dependendo dos fatores de infertilidade encontrados, podemos indicar: acompanhamentos com equipe multidisciplinar, medicações para otimização da fertilidade, medicações para tratamento de doenças que possam afetar a fertilidade, cirurgia ou técnicas de reprodução humana assistida.
Na área da reprodução humana, há três abordagens muito utilizadas: coito programado (namoro programado ou relação sexual programada); inseminação intrauterina (IIU); e fertilização in vitro (FIV). Muitas pacientes usam o termo inseminação artificial (IA) como sinônimo de FIV, mas ele também pode ser utilizado de maneira genérica para todos os tratamentos em reprodução assistida. Também existem técnicas complementares que atendem a finalidades diversas, como ovodoação, teste genético pré-implantacional (PGT), entre outras.
Muitos casais se preocupam com o tratamento de fertilidade e logo associam a reprodução assistida à FIV, mas não é necessariamente assim. O meu objetivo é aumentar suas chances de gravidez para que você tenha um bebê saudável nos braços ao final de todo o processo.
Com base na avaliação individualizada, podemos ampliar as propostas de acompanhamento e melhorar as chances de gravidez, até com condutas simples. Se a FIV for necessária, vamos conversar sobre essa possibilidade e utilizá-la como um recurso para aumentar as chances de gravidez.
Não se trata somente de confirmar uma gravidez. Toda a jornada de investigação, otimização e intervenção também é sobre gerar e transformar uma família. Por trás de cada pessoa, de cada casal, existe uma história que foi construída com expectativas, resultados negativos, medo, insegurança e frustrações. Eu tive infertilidade e precisei fazer FIV para ter o meu bem mais precioso. Nós podemos ter esperança se trilharmos o caminho certo.